domingo, 25 de setembro de 2011

SÉRIE TEXTOS

ÓCULOS ESCUROS


Vim com somente meus dois olhos claros cor de mel e alguma fotofobia para a claridade mundana deste planeta.
Hoje eu os tenho junto com apenas meus tênis furados, de quem tanto gosto.
Assim como amei todos os anteriores, que foram se desgastando aos poucos por tanto uso. A gente não consegue viver sem nossos tênis companheiros e insiste, insiste em tê-los até quando furam, rasgam, se desintegram...
Então a gente sofre mas os abandona e adquire novos tênis que ficarão velhos também.

Será que amar é assim?
Feito um par de tênis que se ajusta aos nossos pés e depois se desintegra?

O amor vai se moldando ao nosso corpo inteiro, invade, domina, toma tudo.
Fica gostoso, aconchegante, perfeito. Torna-se uma extensão de nós, nos completa.
Não se imagina a vida sem ele. Ele passa do sangue para a alma.
Passamos a ser um só. Corpo, pés, alma, sorriso, lágrimas. Amar é compartilhar tudo.
Tal qual com o nosso velho par de tênis, não damos mais um passo sem ele.
Até que o amor nos enxerga como a um sapato velho e rasgado e nos deixa num canto sem pés, sem amor, vazios.

Será que a vida é assim?
Feito um par de tênis e o amor que se moldam a nós e depois se desintegram?

Nosso corpo vai se adaptando a cada fase do tempo, enquanto desenvolvemos o intelecto, a sensibilidade e todas as variáveis que compõe um ser humano. Aprendemos a valorizar cada respirar e nossas conquistas, até os tênis e os amores. Crescemos com nossas famílias, realizamos sonhos e continuamos desejando realizar todos os sonhos impossíveis. Até que o esqueleto reclama a sua idade. Mas como não se troca esqueletos, a alma busca novos ossos, pois que os velhos se desintegraram.

Vim com meus olhos cor de mel e tudo foi ficando mais claro, a ponto da minha fotofobia se tornar tão intensa que os olhos do meu coração estão se fechando.
Nunca mais vou usar tênis.
Nem vou amar novamente.
Tampouco terei outra vida.
Não há mais óculos que escureçam tudo o que vejo, sei e sinto claramente.

Fábio Roberto

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

SÉRIE POEMAS

ADVERSOS

Escreve numa porta de banheiro
O poeta, versos pra sua amada
Sim, pois o poeta é por inteiro
Mesmo com seu riso na privada

Escreve o poeta em cemitério
Versos tão festivos pra sua amada
Ele não teria o rosto sério
Mesmo se a paixão fosse enterrada

Escreve o poeta em uma cova
Sim, são versos pra sua amada
Cabelos do esqueleto ele escova
Feliz, mesmo já sendo alma penada

Escreve pra sua amada até no inferno
Versos com a palavra amaldiçoada
Pra alguns soa romântico e pós-moderno
Mas os nenhuns recebem como bofetada

Segue o poeta rindo ao paraíso
Vendo o amor em face bela e iluminada
Tantos versos feitos de improviso
Só importavam mesmo a sua amada!

Fábio Roberto

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

SÉRIE POEMAS

CELEIRO
Pouco de mim resta-me inteiro.
Colo-me aos pedaços de minhas sobras.
Sem gabaritos, linhas, elos, dobras,
reconstruo-me com esmero de engenheiro.

Em cada parte no revés do chão jazia,
mas fui-me recolhendo da poeira.
Faxinei-me até toda a sujeira
da frustração, sobrar-se íntima e vazia.

Nada mais existo além de vida.
Meus olhos os que fitam-me primeiro,
diamantes garimpados na jazida,

aprovam-me no espelho do meu rosto.
Minh’alma recupera-me em seu posto.
Retorno-me discreto ao meu celeiro.

                       Fábio Roberto

terça-feira, 20 de setembro de 2011

SÉRIE POEMAS

MIJO E PAIXÃO

Houve o tempo de belo regozijo
Quando então aproveitamos o ensejo
De executarmos um humilde mijo
Reconfortante, denso e benfazejo

Ah, o mijo quente que nos abandona
Deixando o frio veículo em mãos
Um pênis murcho que perdeu a dona
Do liquido filtrado pelos rins irmãos

Mas existe festa onde houver bexiga
Aliviada de excretos eliminados
Tal qual uma criança com lombriga

De estômago e olhos saciados
Privada ungida pela urina amiga
Descarga de uréteres apaixonados

                    Fábio Roberto

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

SÉRIE MÚSICAS


METADE


SE NÃO POSSO ESTAR NUM LUGAR,
PELA MÚSICA EU ESTOU LÁ
PELA VONTADE DE ESTAR,
PELA SAUDADE.

SE NÃO POSSO FICAR NO LUGAR
PELA MÚSICA EU FICO LÁ.
PELA REALIDADE DE ESTAR
PELA METADE.

 Fábio Roberto
   (Musicado em 1981)

                                 

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

SÉRIE POEMAS


C asa


e eu pensando em nós dois numa casa

e eu pensando em nós dois

numa casa

pensando

nós dois

casa

nós



2                                                        asas



nós

casa

nós dois

pensando

numa casa

e nós pensando em nós dois

e nós pensando em nós dois numa casa

                                                 Fábio Roberto