O JEITINHO DA MUSA E A MINHA FORMA DE OLHAR
Várias mulheres perceberam a maneira que as olhei, profundamente,
desde que as conheci, desnudando-as completamente na imaginação tarada, em cada
peça de roupa que elas usavam ou despindo-as em cada gesto marcante que as suas
almas, naquela pureza do momento, provocavam nas mãos que alisavam os cabelos
tão gentilmente, que nem importava deles a cor. Um sorriso largo que culminava numa gargalhada retumbante, ou um
sorriso discreto e misterioso, também chamavam a minha atenção.
Certa vez, em um bar muito frequentado por barulhentos publicitários, foquei nos seios acomodados em vestido de ousado
decote, de uma depois amiga sentada na cadeira
em frente ao meu olhar, que passou a viajar
interiormente pelas plagas das ideias mais mirabolantes, até que a voz
irritada da moça, ajeitando os volumosos pomos no recorte da roupa, me despertou:
-Fábio, você nunca viu seios de uma mulher? A minha resposta foi contundente:
-jamais poderia ter visto seios mais belos do que os seus, querida! Ao contar
sobre meus devaneios, rimos do episódio boa parte da noite.
Em outro lance, uma amiga me pediu para escrever a
apresentação do seu livro de poemas e assustou-se ao ver no texto a descrição
exata de como ela estava vestida, em todos os detalhes, no dia em que nos
conhecemos, décadas atrás.
Antes de contar o caso que originou estas digressões,
lembrei de um fato deveras curioso. Convivi quase que diariamente por cerca de
vinte anos com um casal de amigos – o quanto que durou o amor deles – e, com tanto
tempo juntos, várias estórias aconteceram. Teve um período em que, sem
motivação diferente, eu fui abordado por belas donzelas sob o testemunho do
casal. Foi uma, foram duas, três, quatro vezes seguidas, sei lá, e a mim não
cabia questionar o destino e sim aproveitá-lo antes que o encanto passasse. Foi
quando o amigo perguntou na mesa em que estávamos os três, o que explicava os acontecimentos? E a esposa, despojada de frescuras , o que só a intimidade
cúmplice permite, disparou: - é que o Fábio tem “cheiro de p---o! Elas o atacam!
O amigo, tentando disfarçar o ciúme, não resistiu a perguntar: - mas eu não
tenho esse cheiro? Teve que ouvir a voz da sinceridade, saindo da garganta da esposa: - não! Quase
apanhei nessa noite, sendo, como sempre, inocente.
Contei tudo isso para registrar a visita que recentemente
recebi, da musa das musas. Conversávamos despreocupadamente, como de hábito. Subitamente notei, enquanto a musa depositava palavras no ar, seus
lábios delicados que emolduravam a fala, quase uma melodia desenhada nessa
partitura etérea. Relembrei, em segundos, fechando os olhos pra disfarçar a dor
que tenho sentido há dias, o tanto que compartilhamos de alegrias, aventuras e
artes. Paixões. Abri os olhos novamente e a vontade de beijar aqueles lábios
apaixonantes, foi forte demais, tanto quanto aquela que senti no primeiro dia
em que a vi. Mas igual àquela oportunidade, não beijei. Só consegui dizer:
-como você está linda! O jeitinho cativante dessa Musa ao olhar pro lado, quase
que perguntando modestamente a um ser imaginário se era dela que eu estava
falando, preencheu o meu coração de alento. Logo depois a Musa foi embora e eu
aproveitei a dor do corpo para lagrimar de saudade.
Espero que as amigas que ainda pensam em me visitar e que
porventura não tenham percebido como as olho com olhar de tara, admiração e
amor, que não desistam de vir. Essa é apenas a
minha forma de olhar.
Fábio Roberto