quarta-feira, 30 de maio de 2018

VULTO

Não sabia se era sonho ou realidade.
Naquele instante eu não estava vivo,
Apenas existia.
Eu era matéria ocupando um ponto no espaço,
Mas meu lugar estava vazio e transparente.
Quis me lembrar se havia adormecido,
Mas não sabia se fora ontem ou hoje
Que havia acordado.
De fora dos meus olhos me olhei,
Vi somente um vulto e pensei:
Seria eu minha sombra?
Mas como, se ali não havia luz?
Luz.
Quis entender,
Mesmo sem saber se possuía um cérebro.
E comecei a achar que nada fazia sentido.
Ou ele estaria exatamente na ausência de?
Então eu quis morrer,
Mas como eu não sabia se havia nascido,
Abri os olhos,
Respirei
E chorei.

Fábio Roberto
Musicado por Titi Trujillo em 1984

terça-feira, 29 de maio de 2018

QUINZE FRASES

Sagrado
É aquilo que te faz bem. Principalmente se alguém acha que isso é pecado.

Gerações
Quando filho eu queria mudar o mundo. Quando pai eu queria explicá-lo. Agora avô eu digo: vamos apenas viver o mundo?

Ovada
O ladrão só vê do ovo algema.

Mui Amigo
Páscoa é quando o peru ri do bacalhau.

Lábia
Os vendedores mais presentes são embrulhões.

Parceria
É somando que se multiplica.

Reclame
Propaganda é onde você pode ser chamado de exibido.

PIB
O PIB - Produto Interno Bruto só cai porque a PIB - Propina Institucional Brasileira só cresce!

Dureza

Na atual conjuntura quem tinha “coração de ouro” já o penhorou.

Junção
Dois corpos apaixonados podem ocupar o mesmo lugar no espaço.

Causídico
Consoante à lei escritores pedem ao alfabeto: advogais por nós!

Deus sabe o que não faz.

Pipocando
Ironia é uma moça tentar vender milho com a maior cara de pamonha!

Conceitos Sexuais
Fazer sexo é divino. Não fazer é sacanagem.

Tarde no Shopping

Os clientes sempre têm razão. A razão é que não têm clientes

Fábio Roberto

Do Livro das Frases, Questões e Trocadilhos


segunda-feira, 28 de maio de 2018

UM DIA

Vai o dia embora envergonhado
E vai tarde, apático, desengonçado
Lúgubre, sombrio, tristonho, cinza
Desfigurado rosto, coração ranzinza
Não será lembrado ou esquecido
Sua estória não deixou céu comovido
Foi inútil dia, nem feriado, nem rotina
Tão longo e sua queda repentina
Um dia que passou de voz calada
Os olhos nem abriram, natimortos
Passos insalubres, duros, tortos
Levam a alma rude, despetalada
Acaba e não renasce, não há nada:
esquifes, velas, rezas, choros, portos

Fábio Roberto
Do Livro dos Poemas

sexta-feira, 25 de maio de 2018

O CRENTE

A vida é fria tristeza.
A gente descuida e insiste
em ver nela sol e beleza.
Com dor, mas sorriso persiste.
A vida é dura e covarde.
Olhos negros de uma coruja
espreitando o fogo que arde
na alma, antes que fuja
o alento. Descanso ou esperança...
Não há nada após o futuro.
Só o abraço de uma criança
chamada Morte. Silêncio, escuro.

Fábio Roberto
Do Livro dos Poemas

quarta-feira, 23 de maio de 2018

KAMIQUASE

Tem gente que é quase
Quase gente, quase nada
No espelho, forte e abonada
Coração e alma sem base
Tem gente que quase é
Falta um bocado de caráter
Não tem corpo, tem um cárter
Em bom senso é ralé
Tem gente que nem quase
Personalidade de ameba
Com a ignorância se amanceba
Não sabe terminar uma frase
Pra esses seres digo: jaze!
Posando de aristocrata
Sangue tipo de barata
Quer morrer e é Kamiquase

Fábio Roberto
Do Livro dos Poemas


segunda-feira, 21 de maio de 2018

NEVE

É possível transformar o tudo em nada,
deixar morrer a vida iluminada e vibrante,
fugir tal qual um insano retirante,
da chuva benfazeja que lhe rega a estrada.
Pra que beber da água, se o sol o sangue seca?
Por que molhar os pés um tempo e ter descanso,
abrir o sorriso n’alma, respirar e ser o avanço,
adormecer e ter o sonho que qualquer medo breca?
Um amor vale à pena ou qualquer pena.
Um amor intenso que torna até o passado leve.
Uma paixão tão forte que para o futuro deve
explicações. Por que a solidão entrou na arena,
com seu manto de tristeza e fria neve?
Porque a mão do amor o adeus acena.

Fábio Roberto
Do Livro dos Poemas

quinta-feira, 17 de maio de 2018

COFRE


O meu negócio agora é grana.
Vou aposentar-me da poesia.
Grana. É isso e beber uma cana.
Basta de música e melancolia.
Só grana eu vejo na frente.
Por ela eu comerei até grama.
Chega de ser indigente,
honesto e ter jornais como cama.
O meu negócio agora é grana.
Nem mulheres cheias de amores quero.
Comprarei putas, chega de puritanas.
Com grana terei os carinhos que espero.
Com grana comprarei saúde.
Ficarei forte, me farei mais novo.
Terei felicidade amiúde.
Serei senhor do sorriso do povo.
Chega de ajoelhar e rezar.
A minha grana corromperá padres e pastores.
Até o demônio ficará com pesar.
Comprarei dele todos os temores.
Grana. Depois vou distribuí-la aos pobres.
Assim farei para Deus me perdoar.
Serei o dono das almas nobres
e só a minha a um cofre irei doar.

Fábio Roberto

terça-feira, 15 de maio de 2018

AO DIRETOR

Eu estou tão cansado que não tenho sono
e digo a você que do mundo é o dono,
o regente, o diretor do espetáculo,
que não precisa me doar tanto obstáculo.
Sozinho tropeçarei em minhas pernas,
cada vez que me expulsarem das tavernas.
O mundo fica estranho quando sóbrio:
bacilo, bactéria, vírus e micróbio.
A vida deixa qualquer um atônito.
Eu mesmo vou ter que limpar o vômito,
do estomago embrulhado pela raiva.
Mas tudo passa e até o futuro irá passar.
A memória, a quem importa devassar?
O sangue, comovido, some na gaiva...

Fábio Roberto
Do Livro dos Poemas


domingo, 13 de maio de 2018

MIRAGEM

O tempo não foi complacente hoje
Nem pretendia. Nunca o será.
O tempo, sem pressa e rápido, me foge.
Descortinará
As pálpebras.
Álgebra
Somando o vazio
Com o psiu
Solitário na madrugada.
Lua estatelada
No céu
Escuro.
Véu
Que cobre o muro
Onde meu carro, imaginando não mais ser matéria,
Encontrará o impacto da realidade crua.
Pior teria sido cortar a artéria
Nua
Do pensamento, antes que a hora passasse
Sem que minha alma se costurasse
À tua.
A rua
Bebe insaciável o meu vinho
E me engole toda dor.
Vinho, derramado vinho. Adivinho
Qual a dor.
Sorrio ao tempo e lhe digo:
Tu e eu somos eternos,
Caro amigo.
O tempo me abraça forte e terno
E desaparecemos dos nossos olhos feito miragem.
Fumaça, névoa, neblina que o vento dispersou na paisagem.

Fábio Roberto

quinta-feira, 10 de maio de 2018

BATALHAR

Batalhar é suave
Batalhar é suave idade
Batalhar é sua vida
E sua ventura
E sua aventura
É batalhar a sua vida
Batalhar é suave idade
Batalhar é suave
Batalhar a sua vida
É sua ventura
É sua aventura
A batalhar a sua vida
Batalhar é suave
Batalhar

Fábio Roberto
A canção é de 1983 e posso dizer agora que cansa


segunda-feira, 7 de maio de 2018

MENINA SEM NOME

Qual é o nome da menina?
Que te importa? Vês, imaginas.
Tu não és poeta? Ensinas,
Batizas, Apelidas... Mina!
Mina de carvão e solidão?
Mina com olhar de soslaio?
Olhos derramam imensidão.
Se me cruzam eu fujo, saio...
Por que teu nome se precisa?
Teu veio, teu corpo, menina?
Explorar-te, arte precisa.
Pedra preciosa és: Mina!
Sorriso existe mesmo triste.
Quem sabe o que vai à vida?
Mas ao poeta que te assiste,
Mina, diamante, jazida!

Fábio Roberto

sábado, 5 de maio de 2018

CLAVE DE FÁ

A tua vida é admirável ao ser lida em partitura. Respiras compassadamente, ora adágio, ora moderato, por vezes allegro, outras prestíssimo. Sempre seguindo a batuta ritmada do coração que teu sangue quente alimenta, prenunciando belo arranjo orquestral.
Tudo começa ao teu abrir de olhos, como que despertando violinos, violoncelos, violas, contrabaixos e harpas, cordas que obedecem cada teu piscar.
As notas se sucedem quando sorris. Executas um sol para o dia que nasce. A instrumentação vai crescendo aos movimentos dos teus braços e pernas, até que gesticulas as mãos delicadamente, comandando um comovente solo de violoncelo desenhado em clave de fá.
Tudo silencia aguardando outras ordens. Com novos e firmes meneios instigas e aos poucos todos os instrumentos vão se incorporando à voz suave da maestrina.
As madeiras integradas pelas flautas, oboés, clarinetes e fagotes juntam-se ousadamente às sonoridades dos teclados e cordas.
Súbito balanças os cabelos e a orquestra inteira retorna, agregando também o pulsar forte das percussões com seus carrilhões de sinos, pratos, timbales, xilofone, gongo, triângulo e caixas. Com a cabeça instruis o apoio do naipe de metais, retumbando trombones, trompetes, trompas e tubas.
Impressionante a harmonia, a música vibrante que tu és. Como eu queria ser o compositor dessa sinfonia ou um maestro para reger o som escrito em tua pele.
Eu te aplaudiria, mas fico quieto, totalmente emudecido, para continuar ouvindo somente o teu som.

Fábio Roberto
Do Livro dos Poemas
Escrito tempos atrás para a Musa...


sexta-feira, 4 de maio de 2018

A ESTRELA

Eu te vejo como o por do sol
dos olhos.
Luz que vai morrer
pra intensa força do luar
me envolver.
Entrego-me às tuas mãos,
esqueço as sombras de viver.
Exploras minha escuridão,
acender.
E eu brilho feito uma estrela,
não importa que outro dia irá chegar.
Eu me escondo no teu céu em outro mundo
e renasço ao por do sol.

Fábio Roberto
canção de 2008


quarta-feira, 2 de maio de 2018

PERSPECTIVAS

Olhando a vida com os olhos da vida,
só verás a perspectiva da morte.
Olhando a vida com os olhos da morte,
verás somente a vida.

Fábio Roberto
Do Livro dos Poemas


terça-feira, 1 de maio de 2018

C asa


CONTATUAGEM

Tatuei em teu corpo a palavra blefe.
Tentaste apagar, ainda sobrou F.

E o meu F banhado do teu suor,
contou: one... two... tree... four...

Fábio Roberto
Do Livro dos Poemas