sábado, 11 de novembro de 2017

POEMA SUAVE

Sóbrio eu não existo em minha cabeça. A minha cabeça passeia longe de mim.
Sóbrio a realidade é muito pior, porque a cabeça não descansa. E eu não sei aonde escondo o cansaço.
A inteligência, a criatividade, a sensibilidade e a pressa se aguçam se eu estou sóbrio e isso é cruel. A alegria se torna tão extrema quanto a melancolia.
Sóbrio, todas as drogas que já usei se acendem em mim violentamente. Penso de forma mais ousada, tenho vontade de voar o carro naquela estrada mesmo que o carro se arrebente. Prefiro até ir sem freios.
Sóbrio os poemas são mais agressivos, as músicas mais encrencadas... a palavra deixa de ser irônica para ficar sarcástica e amarga.
Sóbrio eu arrisco tudo: a vida, o amor, a amizade, a família, o trabalho. Fica tudo nublado, tudo escurecido, percebo que as pessoas são muito mais ridículas do que o normal.
Sóbrio eu tropeço na minha alma. Quero que os demônios e os deuses morram abraçados. Eu mergulho nas viagens mais profundas do bem e do mal. Não há mais o certo e o errado. Não tenho medo de nada. Desrespeito qualquer lei, dogma, regra, contrato, convenção, norma ou acerto. Nada me segura. Nada me impede. Perco completamente o medo e os limites quando estou sóbrio.
Sóbrio eu não me olho no espelho porque não estou lá. Estou do lado de fora de mim. Sozinho como o mais miserável dos pecadores. Sozinho porque não vou compartilhar este momento de lucidez ensandecida com ninguém.
Quando eu voltar desta paisagem sombria e selvagem talvez renasça em um poema suave. Palavras e cenas que os teus e os meus olhos gostarão de ler e ver. Ou esquecer.
Fábio Roberto

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